27 de abril de 2010

A cheirar o trabalho duro...

Já foi feita distribuição pelo serviço de Medicina. Parece que a minha orientadora é uma mulher de armas. Apenas moderadamente simpática, mas muito competente e que sabe muito. Para mim, está óptimo. Não quero um orientador que me liberte de trabalho ou me mande embora cedo. Quero alguém que me ensine.
No próximo ano, estarei sozinha a ver doentes. Terei mais responsabilidade do que a que desejaria. Por isso, se é assim que tem que ser, então quero ser o melhor possível.

Não me importo de trabalhar como uma desalmada. Não me importo de só poder almoçar 2 bolhachas ás 4 da tarde, nem de não dormir mais que 4horas por noite. Não me importo de não ter fim de semana para descansar. Não me importo de ter urgência ao domingo. Não me importo de ter que estudar todos os dias depois de 8 horas de trabalho, até me deitar completamente exausta. Não me custa ficar em casa trancada no escritório dias a fio, mal vendo a luz do sol. Porque não há nada, rigorosamente nada que me faça sentir melhor comigo mesma do que saber que fiz o melhor pelo meu doente...

Irrita-me quando ouço as pessoas dizerem que os médicos não querem saber.
É óbvio que nesta, como em todas as outras profissões, há bons e maus profissionais. Mas acreditem em mim, a grande maioria de nós dá tudo o que tem e o que não tem...
Todos os dias vemos pequenos milagres no serviço... Pequenas grandes conquistas... E é tão bom saber que fazemos parte disso... é tão bom ver o nosso doente melhorar... :) A sério... Ainda que seja devagarinho. Ainda que seja muito, muito pouco...

Muitas vezes o nosso empenho não é suficiente. A morte faz parte da vida, afinal. No meu caso, ainda me custa muito, custa demasiado, até. Porque custar, vai custar até ao fim, mas ninguém conseguiria fazer isto se fosse sempre tão doloroso... Estou à espera que a experiência me vá tornando mais capaz de suportar estas perdas. Ainda as torno muito minhas...

Os doentes não compreendem muitas coisas. Nem têm que compreender, não é suposto. Mas nós temos a informação do nosso lado, e é com isso que temos que jogar. Muitas vezes temos que tomar decisões que os doentes não entendem, nem aceitam. Quando assumimos uma posição que vai de encontro ao que é melhor para o doente, e não é isso que o doente entende como o melhor para si, somos automaticamente rotulados de "maus médicos". Ora, é suposto que a nossa consciência limpa seja suficiente para nos confortar nestas alturas. Mas só quem está deste lado sabe como é difícil dizer um "não" a alguém que sofre. Sobretudo, porque os médicos também são doentes de vez em quando...

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